Voepass: pedido de autofalência compensa mais que recuperação judicial?
A Voepass Linhas Aéreas, anteriormente conhecida como Passaredo, protocolou nesta semana seu segundo pedido de recuperação judicial.
A medida ocorre após a suspensão de suas operações pela ANAC em março, devido a falhas nos sistemas de gestão operacional da companhia, e poucos meses depois de um grave acidente aéreo ocorrido em agosto de 2024, que deixou 62 mortos. A empresa, que já havia ingressado com pedido semelhante em 2020, agora busca nova proteção judicial diante de dívidas estimadas em R$ 400 milhões.
A Lei nº 11.101/2005, que regula os processos de recuperação e falência no Brasil, prevê a possibilidade de mais de um pedido de recuperação judicial, mas impõe condições específicas.
De acordo com o sócio do Godke Advogados e especialista em Direito Empresarial, Marcelo Godke, a lei estabelece que, para um novo pedido de recuperação judicial ser admitido, é necessário que tenham se passado pelo menos cinco anos desde a concessão da recuperação anterior. “Caso contrário, o novo pedido pode ser indeferido, salvo em situações excepcionais devidamente justificadas”, explica.
No caso da Voepass, o novo pedido ocorre antes do intervalo mínimo de cinco anos, o que poderá suscitar questionamentos jurídicos sobre a admissibilidade do processo. Ainda assim, o Judiciário pode considerar a existência de fatores extraordinários que justifiquem a reiteração da medida. “O Judiciário analisará se há elementos que justifiquem a nova solicitação, como mudanças significativas nas circunstâncias da empresa ou eventos extraordinários que tenham impactado sua capacidade financeira”, avalia o advogado.
A recuperação judicial é uma ferramenta importante para preservar empresas com potencial de retomada, mas seu uso recorrente pode indicar problemas estruturais de gestão ou inviabilidade econômica. “Embora a RJ seja um direito das empresas, é preciso ter cautela para que o instrumento não seja banalizado. O sistema jurídico exige boa-fé e demonstração clara de que há viabilidade na reestruturação”, afirma.
O caso da Voepass também evidencia os riscos específicos enfrentados pelo setor aéreo, marcado por alta complexidade operacional, custos elevados e margens apertadas. Crises reputacionais e operacionais, como a suspensão de voos e acidentes aéreos, tendem a agravar ainda mais o quadro financeiro das companhias.
“Entendo que, na atual situação, um pedido de autofalência seria mais adequado, pois, nos termos da LRF, art. 47, a ‘recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor’. Tendo em vista os problemas da companhia aérea não se restringem à mera crise ‘econômico-financeira’, atingindo também, de maneira bastante grave, a sua reputação, bem como as restrições impostas pela Agência Nacional de Aviação Civil, vejo que a possibilidade de recuperação tenha sido sobremaneira reduzida. Dessa forma, o caminho mais lógico seria a liquidação coletiva da empresa, por meio de processo falimentar”, alerta Godke.
O novo pedido de recuperação da Voepass será analisado pela 8ª Vara Cível de Ribeirão Preto, e seu desfecho poderá ter impacto sobre a forma como o Judiciário lidará com novos casos de reiteração de pedidos.
“Em tese, a Voepass poderia manter suas atividades durante uma RJ, mas dependeria de uma ordem do juízo recuperacional para que a empresa pudesse voltar a voar. Pelo que foi recentemente (11.3.25) noticiado no site da Agência Nacional de Aviação Civil, a companhia aérea teve suas operações suspensas, em caráter cautelar, pela referida agência reguladora. Por isso, a possibilidade da Voepass voltar a ter atividades normais é bastante reduzida”, conclui o especialista.

Fonte:
Marcelo Godke – Sócio do Godke Advogados. Especialista em Direito Internacional e professor da Faculdade Bela Vista. Mestre em Direito pela Columbia University e Doutor em Direito pela USP.
Foto: Adriano Moura Buzeli – Revista Piloto Ribeirão
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